Misturando farinha e audiovisual em Ponta Negra

Projeto Vídeo registra a produção da farinha de mandioca na comunidade caiçara através do olhar das crianças

Através das lentes das câmeras fotográficas somos capazes de ver as coisas comuns do dia a dia em um lugar de valor, com uma perspectiva de reconhecimento e respeito a pessoas, lugares e saberes. Na última semana, os participantes do projeto audiovisual do Centro de Educação Integral Cairuçu, na Ponta Negra, foram convidados a acompanhar o processo de produção da farinha de mandioca e registrá-lo em fotos e vídeos.

O objetivo foi proporcionar uma observação cuidadosa desta prática ancestral, que é uma herança dos povos indígenas, e apresentá-la através da linguagem e das técnicas do audiovisual, com o auxilio da educadora Camila Portela. “Propus que experimentássemos juntos a linguagem do documentário, afim de que os alunos da educadora Tayná Pádua, do curso Jovem Comunicador, pudessem entender e sentir um pouquinho o quão especial e importante é a produção de farinha para os moradores da Ponta Negra. Mal podemos esperar para começarmos a editar esse material, que será o produto final do nosso curso de Vídeo.”, comenta Camila.

Os participantes, Igor, Vitor, Duda, Luiza e Carlos, caminharam pelas trilhas que conhecem desde que nasceram, portando as câmeras do curso, em direção a roça do Sr. Juarez e da dona Claudete. Eles acompanharam a colheita e o transporte da mandioca até a casa de farinha da família, trajeto feito a pé, com os sacos de ráfia reutilizados cheios de mandioca, sendo carregados nas costas, assim como a lenha utilizada para ascender o forno.

As primeiras etapas foram a descasca e a lavagem. Posteriormente, no interior da casa de farinha, dona Claudete passou a raiz pelo ralador, enquanto Sr. Juarez girava sem parar o rodete, como chama o maquinário. Após ralada, a mandioca foi prensada, em uma prensa rudimentar feita pelo próprio Juarez, e enquanto seu suco foi extraído, aproveitamos para almoçar. Quando retornamos a massa já estava enxuta, pronta para ser peneirada e, por fim, forneada. Este trabalho, que pode levar um dia inteiro, conta com a participação da família de Juarez e Claudete, e é ensinado na comunidade por muitas gerações através da oralidade.

A farinha de mandioca, ou farinha da terra como a chamamos em Paraty, compõe a base da alimentação das famílias caiçaras: está presente na sopa d’água, no pirão de peixe, e completa o prato de peixe com banana. Ela é saber e sabor para as comunidades tradicionais, assim como para os habitantes de todo o território, hoje reconhecido como Cidade Criativa da Gastronomia pela Unesco.

O projeto vídeo acontece, semanalmente, no Centro de Educação Integral Cairuçu, mais conhecido como casinha, para jovens com idades entre 13 e 18 anos, que ao desempenhar o papel de protagonistas de suas próprias narrativas, potencializam habilidades socioemocionais, além de obter uma nova forma de expressão ilimitada. Para Gilmara Rocha, coordenadora do projeto, trata-se de um laboratório de práticas e saberes: “Um aprender fazendo que reconhece e valoriza os saberes, a cultura e a criatividade dos jovens e busca articulá-los a novos conhecimentos operacionais e especializados, que permitem aportar ideias, olhares e conhecimentos para o mundo do trabalho. Somados a isso, estimulamos a ampliação do capital cultural de cada um, em um espaço de ensino, aprendizado e criação capaz de contribuir para a circulação, distribuição e exibição das expressões das juventudes caiçaras.”, explica a coordenadora.